segunda-feira, 31 de outubro de 2011

E o boi num lambe!!



Tô colocando aqui o texto do Piauiês que teve alguns trechos publicados na revista Cidade Verde. Boa leitura!!


A Arlinda me pediu pra escrever um texto falando do nosso Piauiês, pra postar no blog dela do Vooz. Eu escrevi, ela colocou lá e as pessoas gostaram. Comentaram bem o meu texto. Então eu coloquei aqui pra vocês verem também. Espero que gostem. 

Assunta aí! A Arlinda Monteiro, colega do curso de jornalismo, foi morar em São Paulo pra fazer especialização. E num é que acharam que a bichinha falava esquisito? Mandaram ela parar de falar esse tal de Piauiês e conversar direito. Hum... Hum-hum! Eles é que não sabem a valia que tem nossas palavras...

Durante o curso de jornalismo, nós falamos muito nessa dita-cuja Globalização que, pra facilitar mais a comunicação, todo mundo ia ter que falar parecido. De preferência, uma língua só. Tipo esse Inglês aí, metido a besta.

E apois... Se é pra todo mundo falar do mesmo jeitim, eu voto pro Piauiês ser a língua universal.

Marminino! Tem coisa mais bonita do que ver duas amigas se encontrando e uma dizer pra outra: “Quequiá, mermã?”.

E o nosso gargurau ? É comida de toda versidade. O povo que vem de fora, chega fica de olho grelado quando vê, bem na rosca da venta, uma Maria-Isabel quentinha, acompanhada de paçoca e um pedação decarne-de-sol em cima. Ui... Chega dá na fraqueza,depois.

E isturdia, eu encontrei um livro que se intitulava “A Grande Enciclopédia Internacional de Piauiês”, do jornalista escrinche Paulo José Cunha.

modos que, eu li que ele ajuntou todas as nossas expressões, as que só eram ouvidas e faladas por essas bandas e levei um espanto.

Arre égua!! Só a gente é que sabe falar essas coisas bonitas?? Porque, num é querendo fobar não, mas... A gente fala bonito, né não siá?

Foi aí que eu tomei entendimento de que o resto das pessoas tinha que experimentar também o sabor de nossa piauiensidade e resolvi usar o jornalismo pra isso.

sucesso do rádio de pilha foi a revista Gargurau que nós produzimos na UESPI. Ela reunia o nosso Piauiês e um de comer de ótima qualidade. E no meio desse aribê de comida boa, nós colhemos as preferidas, aquelas que chega a gente come de capitão, e contamos suas histórias e receitas.

Fizemos pesquisas, visitamos o Mercado da Piçarra, onde a Paixão faz sarapatelmão-de-vaca e buxada de bode como ninguém. Dizem que a comida é reimosa. Mas piauiense que é piauiense, num acha isso não.

Tá certo que, em pleno Bê-erre-ó-bró, comer um prato de baião-de-dois com sarapatel, mão-de-vaca e farinha, no pino do mei dia, é pra quem é muito apresentado. Mas também é bom que chia!

Então, a maior lição que tiramos de todos esses estudos é que, devemos valorizar o nosso quintal. O máximo que podemos. Assim como também temos que aceitar o modo de falar e os costumes dos outros brasileiros. Não há nada mais bonito do que esse taipeirão de sotaques, jeitos e expressões diferentes. E no final de tudo, somos todos a mesma coisa. Somos todos brasileiros.

P.s: Arlinda, manda esse povo parar de frescar com tua cara. Eles querem ser demais. São muito é bom de taca! Que marmota é essa?! Se tu te importar, tu num vale uma cagaita podre! Piauiense é piauiense... E boi num lambe

Porrunchêromermanzinha! Quando tu der fé, eu tô por aí!

GLOSSÁRIO PIAUIÊS
Assunta: Presta atenção.
Bichinha, bichim: forma carinhosa de se referir às pessoas.
Hum... Hum-hum: onomatopéia com vários significados. Aqui eu quis dizer, “coisa sem propósito”.
Valia: importância.
E apois: E então.
Marminino: Ora essa!
Quequiá?: O que é que há? Como vai?
Gargurau: comida.
De toda versidade: de todo tipo.
Olho grelado: arregalado, fixo num ponto.
Rosca da venta: na frente, na cara.
Maria-Isabel: um arroz, tipo carreteiro, feito com pequenos cubos de carne-de-sol muito bem temperados.
Paçoca: depois de frita a carne-de-sol é pisada no pilão com farinha de mandioca e cebola até ficar em fiapos.
Carne-de-sol: carne colocada pra secar no sol.
Dar na fraqueza: bateu forte (a comida).
Isturdia: outro dia.
Iscrinche: coisa ou pessoa elegante, alegre.
Modos que: de modo que.
Ajuntou: reuniu
Espanto: susto.
Arre égua: caramba!
Fobar: contar vantagem.
Siá: Forma sincopada de Sinhá, que por sua vez vem de Senhora. No Piauí é palavra de uso restrito das mulheres ou dos gays.
Sucesso do rádio de pilha: acontecimento de sucesso.
De comer: comida.
Aribê: grande quantidade.
Capitão: comida amassada com as mãos.
Paixão: cozinheira famosíssima do Mercado da Piçarra, bairro da zona sul de Teresina.
Sarapatel: prato feito com os miúdos do bode ou do boi.
Bê-erre-ó-bró: os meses terminados em BRO são os mais quentes do ano (setemBRO, outuBRO, novemBRO, dezemBRO).
Pino do mei dia: meio-dia.
Apresentado: exibido.
Bom que chia: bom demais.
Taipeirão: grande quantidade.
Frescar: Ficar de “frescura”, chatear, mexer com alguém.
Só quer ser: usa-se para criticar pessoa que quer passar pelo que não é.
Cagaita podre: Deliciosa frutinha doce-azeda, muito comum nos cerrados do Piauí e do Centro-Oeste. Com um detalhe: a fruta é laxante, por isso só deve ser consumida gelada, senão dá uma disenteria daquelas de assoviar por trás. “Fulano? Hum, aquilo num vale uma cagaita podre”. Ora, se quente a fruta já provoca esse tiroteio, caucule uma cagaita... podre.
Bom de taca: pessoa que fez alguma coisa errada.
Marmota: coisa esquisita.
E boi num lambe: e não tem pra ninguém.
Porrunchêro: pois um cheiro.
Dar fé: perceber.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Viagem no tempo.



Um dia desses, uma música do Zé Ramalho me fez voltar anos no tempo e sentir o cheiro de café coado no pano que minha avó fazia quando acordava de madrugada, todos os dias.

Acompanhado do café, vinha sempre o rádio ligado na rádio Livramento e eu já ouvi tocar várias vezes esta música, na programação de domingo.

E eu não sei como mas, a casa da vovó nos chamava a acordar cedo e aproveitar cada minuto do dia. Ora, era muita coisa pra fazer e o final de semana era curto.

Um dia, choveu e ventou muito forte e o pé de caju caiu e ficou, finalmente, do nosso tamanho. As raízes, agarradas ao chão, deixaram que ele vivesse mesmo assim e ali, nasceu uma casa com quartos, sala, cozinha... Um navio que atravessava os mares, ou só um pé de caju, mesmo...

O pé de goiaba que ficava aos pés do girau nunca viu uma goiaba madura. A gente, simplesmente, não tinha paciência de esperar!

E minha avó sempre foi briguenta e ranzinza mas, quando eu e minha irmã íamos passar as férias lá, ela bem que fazia canjica pra mim e comprava aquela banana de casca verde que eu só lembro de comer lá.

O vovô só acordava a gente fazendo umas caretas engraçadas e imitando a voz do Pato Donald e a gente morria de rir.

Os bichos viravam gente e ganhavam nomes próprios... Foi assim com a Miúda, a porquinha enjeitada e magricela. Aí veio o Júnior, o cabritinho enjeitado; a Kátia (carinhosamente chamada de Katinha), a cabra marrom e bonita e o Diego, um bezerrinho órfão que perdeu a mãe e quebrou a perna em um acidente com um caminhão.

Tirar manga do pé e comer na hora, banhar de açude, de riacho, subir em árvore e não saber descer, caçar criolí e muta no mato, com medo de se perder...

Parece mesmo que o tempo foi curto. A gente fez muita coisa, aprendeu muita coisa e, mesmo assim, parece que ainda ficou um tantão pra fazer.

Tem gente que diz que eu lembro de cada coisa que aconteceu há mil anos atrás... Eu gosto disso. É quando eu fico mais perto de tudo o que foi bom e continua sendo.

É isso aí.

P.s.: A música era esta aqui.